
Cada mês do ano tem seus encantos. Outubro tem os seus. Mês das missões, de tantos santos queridos, a começar por Santa Teresinha do Menino Jesus, passando por São Francisco de Assis, São Pedro de Alcântara e chegando ao Santo Antônio Galvão. E mês da Senhora Aparecida. Nas linhas que se seguem, vão umas poucas pinceladas com algumas cores e matizes de outubro!
Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM 1. No dia 4 de outubro comemoramos Francesco, esse italiano de Assis e do mundo. Não podemos repetir São Francisco. Nós, seus discípulos, não somos Francisco de Assis. Ele é único. “O Espírito Santo não se repete. Haveremos de descobrir que esse Espírito nos convida a tornarmo-nos, para os homens do século XXI, uma Palavra de vida, a sermos irmãos e irmãs do Evangelho a partir do qual ousaremos abrir novas estradas de liberdade, de esperança e de alegria. Queremos beber da mesma fonte borbulhante da qual Francisco bebeu para encarnar hoje a alegria e a loucura do Evangelho. Francisco não pertence a ninguém. É característica das grandes figura – bem como das grandes obras literárias e musicais – serem inexauríveis. O próprio Evangelho nunca deixa de ser lido, relido, comentado e vivido. É sempre novo!” (Michel Hubaut, La gioa di viverei il Vangelo, Ed. Messagero, Padova 2006, p. 10).
2. Ao pintar com as cores franciscanas de outubro, damos a palavra a Éloi Leclerc: “Deixar Deus agir é, exatamente nada fazer contra a existência, mas aceitar todo o seu mistério com amor e piedade, com paciência e respeito, tal como ele se nos oferece. A existência é um grande mistério. Por que há tantas estrelas? E no fundo céu, esse rio imenso de astros que nunca ninguém foi capaz de contar? E por que os encontramos nós, agora, neste barco? Tudo é mistério. Mas podemos dizer sim a tudo isto e aceitar crescer conjuntamente. Por que tudo o que existe foi chamado a crescer em conjunto. Não apenas lado a lado, ou face a face, mas em conjunto, como um todo harmonioso, como os membros dum mesmo corpo. Nisto consiste deixar Deus agir e ter a fé, a paciência dos santos” (in Desterro e Ternura, Ed. Franciscana, Braga, 1974, p. 106-107). Não é isso que Francisco ensina? Viver é acolher o mistério que se nos revela.
3. No dia 12 de outubro ocorre a passagem do Dia do Mar. Não consegui saber o motivo pelo qual escolheu-se esse dia para comemorar o mar. Que prazer passear ao longo da praia e desfrutar da brisa do mar. O mar...quando quebra na praia é bonito de ver... Dorival Caymi foi o poeta do mar. Mar, praia, pescadores, gente que vai e volta, gente que vai e não volta... Na poética de Caymmi, a mulher vem à praia esperar o marido que devia, mas o marido não volta. Coisas do mar. Há o mar calmo, mas também o mar agitado por tornados e ventos, mar das correntezas, mar dos tubarões que comem as pernas e os braços dos surfistas incautos. Mar das competições esportivas. Mar que lembra para nós o Mar Vermelho, mar da libertação. Mar que devorou corpos de tantos passageiros de um avião da Air France que caiu numa noite tétrica e trágica. Dia do Mar com sua beleza, seus mistérios, seus encantos e seus peixes, mar dos navios cargueiros, dos piratas e do banho de Netuno quando se atravessa o equador...
4. No dia 15 de outubro ocorre a festa bonita de uma espanhola vigorosa chamada Santa Teresa de Jesus. Nasceu ela em Ávila, na Espanha dos mouros e dos toureiros, em 1515, pouco tempo depois da descoberta do Brasil. Era originária de família nobre e tradicional. Dizem algumas biografias que desde a infância se distinguiu por um grande amor pelas Escrituras e teria sido animada pelo desejo do martírio. Aos vinte anos entrou na Ordem Carmelita, no Carmelo da Encarnação. Há os que afirmam que no começo sua vida religiosa não era das mais exemplares. Vivia de muitas conversas nos locutórios. Depois de um longo período de tibieza começou o processo do que ela chama de “conversão”. Quis ela, então, nesse tempo da reforma protestante, servir a Igreja com a dedicação de sua vida. Foi visitada pela graça e conduzida a uma intensa vida de união com Deus. Em 1562 funda o Carmelo de São José, primeira casa da reforma dita teresiana. No tempo da Santa, a Ordem vivia a observância mitigada. Em 1567 encontrará João da Cruz, que se converterá em seu colaborador e diretor espiritual. Até o momento da morte funda diversos mosteiros na Castilla e Andalucía. Foi também dirigida pelo franciscano São Pedro de Alcântara. No leito de morte se declara Filha da Igreja e entrou em agonia dia 4 de outubro de 1582. Foi canonizada a 12 de março de 1623 pelo papa Gregório XV e declarada por Paulo VI primeira mulher doutora da Igreja a 27 de setembro de 1970. Teresa foi grande mística e seus livros são contados entre as obras primas da literatura espanhola.
5. Teresa de Jesus, com efeito, deixou o testemunho de sua vida em seus escritos. No livro da Vida, como numa confissão feita diante de toda a Igreja, faz com que percorramos todas a etapas de sua existência: uma infância precoce do ponto de vista religioso, uma juventude vivida em sucessivas crises, recuperação vocacional aos vinte anos, seguida de uma experiência de vida religiosa marcada por altos e baixos, até sua “conversão”, quase aos quarenta anos. Trata-se de um lento desenrolar de uma história de salvação que, a partir do limite do pecado, vai se desenvolvendo através de conversão sincera e total, em determinada determinación, como escolha total e definitiva, que abre espaço para uma experiência mística de tal forma que Deus pode nela operar maravilhas. Teresa manifesta as transformações da pessoa, do desejo de salvação, da efetiva mudança de vida, da graça do Espírito Santo que a penetra e a leva a uma experiência do dogma cristão, bem como a graça da mística como iluminação interior. Tudo é coroado com a graça do matrimônio espiritual, recebida em novembro de 1572 pela experiência da inabitação trinitária, da comunhão total de Cristo esposo, destinada ao serviço da Igreja, meta ideal da santidade cristã.
6. Teresa fala das mulheres: “O primado contemplativo não tem sua origem em Teresa de Jesus, nas categorias aristotélicas ou platônicas da contemplação, mas brota de uma dimensão de abertura que existe nela. Ela é criatura feita para algo grande e infinito que possa realizá-la, completá-la, cumulá-la. Esta atitude diante de Deus é fundamental em sua vida; dela brota o sentido do senhorio de Deus: não apenas por uma soberania de amor ao qual se entrega, mas também porque o Senhor a excede; ele é o único dono de toda a sua pessoa e de toda a sua vida. O primado de Deus em dimensão contemplativa, numa experiência absolutamente feminina, caracteriza sua atitude diante do Senhor; Teresa é feita para ele. Por isso, diante dele, não se sente intimidada nem como alguém que incomoda, mesmo sabendo que ele é o Senhor da glória. Trata com ele em grande liberdade. “Ó Criador meu”, exclama Teresa, “quando estáveis na terra, longe de sentires desprezo pelas mulheres, até procuraste favorecê-las com grande benevolência...”. Está convencida de que Deus ama e acolhe as mulheres e que Cristo lhes concede amplamente esse amor. Para provar sua afirmação coloca o exemplo da Virgem Maria, aquela que Deus escolheu como mãe, e das pecadoras que Jesus perdoou, recorda a amizade que tinha por Marta e Maria. Estes são os argumentos de Teresa para sentir-se completamente á vontade com o Senhor” (A. Ballestrero, “La dona in santa Teresa, em AA.VV, Teresa d’Avila , Introduzione storico-teologica, Turin, 1982, p. 63).

7. Nesse dia 15 de outubro ocorre o Dia do professor. Esta é outro matiz do mês de outubro. Muitos de nós, frades, fomos ou somos professores ou trabalhamos em entidades educacionais. O tema é complexo, complicado e não é aqui o espaço de refletir sobre todo o significado de nosso trabalho nos colégios. Pensamos nos professores de modo geral, nos professores que foram passando por nossa vida. Queremos simplesmente tecer algumas considerações a respeito da figura do professor e da professora:
As crianças pequenas são entregues, as mais das vezes, aos cuidados de uma professora. Esta profissional, bem ou mal formada, se ocupa dos filhos de nossas famílias boa parte da jornada. Seu trabalho é marcado pela dedicação. Ou então simplesmente, mecanicamente, fazendo as coisas por fazer. Em todos os casos nossos pequenos estão em suas mãos...
De repente desfilam em nossas mentes os professores do tempo do primário. A diretora da escola da Vila que era amiga do prefeito e figura importante na sociedade local. Depois pensamos na dedicação de Maria José, mulher calma que deixava os alunos meio livres. Um dia ficou doente e veio uma tal de Stelina que colocou ordem na sala. A garotada dos dez ou onze anos teve que entrar na linha. Nos primeiros anos da escola, antigamente, se criavam laços entre alunos e professores, em geral, professoras. Estas recebiam presentes: flores, doces que a mãe fazia e até mesmo uma cestinha ovos de galinhas poedeiras que as pessoas criavam no quintal!
Depois vieram esses professores do antigo tempo do ginário e do colegial. Cada um tinha seu jeito e seu feitio. Havia a moça nova, professora de francês, que tinha estudado na Sorbonne e falava um francês admirável, o professor de história, sábio mas sem comunicação, a professora de geografia, católica, muito católica falando sempre das coisas da Igreja. Dizem que ela tinha sido religiosa, me parece das vicentinas.
Essas pessoas, esses professores fizeram parte de nossa vida. Não podemos nos esquecer deles. Alguns eram pessoas de caráter e firmeza. Eles nos passaram esta lição. Outros eram carinhosos que conversavam com os alunos nos corredores e manifestavam afeição. Outros ainda, no meio de uma aula de história, nos ajudavam a refletir sobre o mundo de hoje e a injunções que vivemos.
Lembramo-nos também dos professores ou mestres das faculdades. Alguns deles doutores e promotores do avanço das ciências na cidade e no país. Outros, simplesmente “dadores de aula”. Alguns ajudaram e ajudam os alunos a arrumar as coisas em seu interior e a darem uma orientação humanística à vida. Precisamos de mestres e não simplesmente de transmissores de conhecimentos.
Lamentamos que os professores seja pessoas mal pagas. Muitas de nossas escolas públicas foram sucateadas e os professores perderam todo o gosto em dar aulas. Dão aulas em muitos estabelecimentos e, assim, não conseguem mais colocar entusiasmo em seu labor. Correm, falam, corrigem, obedecem aos diretores e aos secretários de educação.
Num momento delicado do mundo em que crianças, adolescentes e jovens vivem em famílias desestruturadas e esfaceladas penso que a escola, os diretores dos estabelecimentos e os professores poderiam exercer um papel importante no sentido de que essas crianças das favelas e dos bairros mais ricos das cidades tivessem ocasião de pensar, refletir e discernir. No decorrer de uma exposição, em tantos outros momentos da vida de uma escola, os professores poderão suscitar no fundo do coração de seus alunos o desejo de saírem do mundo da superficialidade, de evitarem as drogas e de consagrarem as melhores energias de seu interior para viverem em plenitude. E que eles de vez em quando examinem seu irrequieto coração que os convida a buscar as alturas...
Importante que a escola e seus professores façam uma educação séria e sólida sobre a afetividade, a sexualidade e preparem os alunos, remotamente, para a fundação de uma família.
Independente de cursos de educação religiosa, os professores cristãos, na sala de aula, na reunião com os pais, nos encontros com outros professores serão testemunhas do reino novo que nasceu com Jesus e que se instaura no mundo a partir de pessoas que se revestem da força do Evangelho.
Os pais não podem querer apenas que seus filhos passem de ano, passem nos exames, vençam nos estudos para ganharem dinheiro....Professores esclarecidos haverão de sinalizar em outra direção: formação de homens e mulheres de caráter, gente capaz de viver e conviver, pessoas que deixarão vir à tona suas riquezas mais profundas para que a terra seja mais fraterna e que nunca mais um menino venha a perder a vista numa batalha de torcidas de futebol, e que jovens nunca voltem para casa nas madrugadas de sábado e domingo cheios de tédio e sem nada do coração. Viva os professores!!!

8. No dia 25 de outubro ocorre o Dia do Sapateiro. Tema curioso, esse do sapato e do sapateiro. Sempre me desperta a atenção, quando me encontro com clarissas, de vê-las de pés no chão....sinal de simplicidade, símbolo de despojamento. Interessante observar que os piedosos muçulmanos quando entram no pátio da mesquita, se descalçam. Chega à nossa mente também a figura de Moisés diante da sarça ardente.... O profeta é convidado a tirar as sandálias dos pés porque santa era a terra em que estava pisando.
Quando uma criança nasce, as mães se preocupam em ter sapatinhos de lã para aquecer os pés do bebê. Há senhoras idosas que passam boa parte do tempo fazendo esses sapatinhos de lã para netos, bisnetos e crianças pobres.
Tempos houve em que os sapatos eram para os domingos. Durante a semana muitos andávamos de tamanco e, na roça, descalços. Havia pessoas que abominavam andar calçadas. Por vezes, ainda hoje, em reuniões de pastoral, as pessoas tiram os sapatos e ficam de pé no chão ou simplesmente de chinelos de dedo. Os sapatos eram usados aos domingos. Na segunda-feira era dia de engraxá-los, passar uma flanela para dar brilho e guardá-los para o domingo seguinte... quando a sola estava gasta e o salto comido era hora de levá-los para o sapateiro. Lembro-me de um senhor chamado Vico, o sapateiro...
Os sapatos foram se sofisticando. Há as botas de guerra, os sapatos forrados de lã para o inverno, as coleções de sapatos de salto alto para as mulheres.... falam de salto Luís XV... e vemos mulheres que têm seus saltos presos nos buracos da rua ou na escada rolante do metrô e do supermercado. E de couro passaram os sapatos a serem feitos de napa ou de outros produtos derivados do petróleo. Verdade que há alguns senhores que percorrem sempre a Avenida Paulista com sapatos de cromo alemão... caríssimos... E sempre os chinelos de dedo, práticos mas feiosos, embora ostentando a bandeirinha do Brasil. Eles estão presentes até no interior de Angola.
E dos sapatos se passou para os tênis. Tênis de todas as marcas... As vitrines das lojas de tênis têm uma iluminação toda especial. Eles são artigos da ordem do dia. Antigamente eram usados para o jogo de tênis... Hoje, não mais... São cômodos, práticos... sabemos. Hoje vemos crianças, jovens, freiras, padres, idosos usando tênis com todos os recursos e que dão um imenso conforto aos pés... Existe até mesmo enfermaria de tênis para consertar os tais dos engenhos que não são levados ao sapateiro da esquina, este que vai desaparecendo. E nem falemos do preço dos tênis.. e de pequenos assaltantes que pegam guris da classe alta e arrancam-lhes dos pés tênis que valem 500 reais...
Quando se fala que dia 25 de outubro é dia do sapateiro se pensa no fabricante de calçados que exporta e naquele homem de avental manchado de tinta que bate o couro, cola a sola, costura o sapato... Nossa homenagem a todos eles... Mais importante que os sapatos são os pés e nossos pés e nossos passos precisam ser lépidos na busca dos outros e em trilhar as estradas que nos levam ao coração de Deus.