Os Anjos de Deus na Vida de Francisco de Assis

Arcanjos São Miguel, São Gabriel e São Rafael



Frei Zilmar Augusto Moreira de Oliveira, OFM

1. Hoje a Igreja celebra a Festa de São Miguel, São Gabriel e São Rafael, Arcanjos. Miguel (quem é com Deus) é o arcanjo que se insurgiu contra satanás e seus seguidores. É o defensor dos amigos de Deus e protetor de seu povo. Gabriel (força de Deus) revelou a Daniel os segredos do plano de Deus, anunciou a Zacarias o nascimento de João Batista e a Maria, o de Jesus. Rafael (Deus curou) acompanhou e protegeu Tobias nas peripécias de sua viagem e curou-lhe o pai cego. Se em nossas vidas esses enviados de Deus causam tamanho contentamento, pelo fato de nos sentirmos protegidos, guardados, iluminados, etc, na vida de São Francisco não foi diferente. Ele também pode provar das mediações dos anjos do Senhor.

2. O Seráfico Pai, nutria grande devoção para com estes companheiros e servos de Deus. Quem nos fala um pouco dessa sua devoção é o Biógrafo Tomás de Celano: “Tinha a maior devoção pelos anjos, que estão conosco no combate e que andam conosco no meio da sombra da morte. Dizia que esses companheiros devem ser reverenciados em toda parte e que devemos invoca-los como nossos guardas. Ensinava a não ofender sua presença, e que não se devia ousar fazer diante deles o que não se faria diante dos homens. Considerando que, no coro, salmodiamos diante dos anjos, queria que todos que pudessem comparecessem ao oratório, e que aí salmodiassem com sabedoria. Mas muitas vezes dia que devemos honrar de maneira toda especial São Miguel, porque é o encarregado de apresentar as almas ao julgamento. Em hora de São Miguel, fazia uma Quaresma de jejuns “que, em honra de tão importante príncipe, dever-se-ia oferecer a Deus algum louvor ou algum dom especial” (2Cel, 197). “O Senhor, que consola os aflitos, nunca me deixou sem consolação. Eis que eu não podia escutar as cítaras dos homens e acabei ouvindo uma cítara ainda mais bonita” (2Cel, 126).

3. Por este relato, Francisco nos ensina algumas coisas: A) A ter maior devoção pelos anjos que nos acompanham em meio às lutas e combates de nossa vida, seja espiritual ou concreta; B) não nos esquecermos de invocá-los como nosso guarda e protetor, em nome de Deus; C) não ofender a presença dos anjos, pois eles são a ação de Deus em nossas vidas, em nossa história; D) por fim, talvez pela sua grande preocupação (misericórdia) para com as almas, nos convida a honrar, de modo especial, a São Miguel, que é o incumbido de apresentar as almas para Deus.

4. Francisco de Assis, em muitos momentos de sua vida, pode provar das consolações do Senhor por meio de seus anjos: “Certa vez, o santo, prostrado por muitas doenças ao mesmo tempo, sentiu desejo de um pouco de música que lhe devolvesse a alegria de espírito. Mas como as conveniências não permitiam contratar homens para esse fim, os anjos deram sua colaboração para alegrá-lo. De fato, certa noite, enquanto vigiava em meditação, de repente ouviu uma cítara tocando com uma harmonia maravilhosa e uma melodia dulcíssima. Não se via ninguém, mas percebia-se claramente o afastamento ou a aproximação do citarista. Enlevado em Deus o espírito do santo, sentiu-se repleto de tanta suavidade com aquela dulcíssima e inefável harmonia que lhe pareceu estar gozando já na mansão eterna” (LM V, 11).

5. Francisco era tão fiel ao Senhor, que alguns biógrafos chamaram sua vida de “vida angélica”. Relataram todas as suas características que podemos, aqui, deduzir como características próprias dos anjos do Senhor. Basta nos atentarmos nesse relato e vamos perceber o perfil desenhado de Francisco e dos Anjos de Deus seus pontos similares: “Como era bonito, atraente e de aspecto glorioso na inocência de sua vida, na simplicidade das palavras, na pureza do coração, no amor de Deus, na caridade fraterna, na obediência ardorosa, no trato afetuoso, no aspecto angelical! Tinha maneiras simples, era sereno por natureza e de trato amável, muito oportuno quando dava conselhos, sempre fiel a suas obrigações, prudente nos julgamentos, eficiente no trabalho e em tudo cheio de elegância. Firme nas resoluções, equilibrado, perseverante e sempre o mesmo. Rápido para perdoar e demorado para se irar, tinha a inteligência pronta, uma memória luminosa, era sutil ao falar, sério em suas opções e sempre simples. Era rigoroso consigo mesmo, paciente com os outros, discreto com todos. [...] E como era muito humilde, mostrava toda a mansidão para com todas as pessoas, adaptando-se a todos com facilidade. Embora fosse o mais santo de todos, sabia estar entre os pecadores como se fosse um deles” (1Cel 83). Por este retrato angelical, é muito explícito o modo de ser dos anjos de Deus. Ao passar o olhar por estas características, é muito fácil identificarmos a mediação, as posturas, a simplicidade e mansidão dos anjos em nossas vidas, na vida de Francisco e na vida de todo o povo de Deus ao longo da história.

6. Foi rezando no Monte Alverne que o Pobrezinho de Assis, mais uma vez, experimentou dos mistérios do Senhor, que o visitou em oração: “[...] teve uma visão de Deus em que viu um homem, com aparência de Serafim de seis asas, que pairou acima dele com os braços abertos e os pés juntos, pregado numa cruz. Duas asas elevavam-se sobre a cabeça, duas estendiam-se para voar e duas cobriam o corpo inteiro. Quando o servo do Altíssimo viu isso ficou muitíssimo admirado, mas não compreendia o sentido dela. Sentia grande prazer e uma alegria enorme por ver que o Serafim olhava para ele com bondoso e afável respeito. Sua beleza era indizível, mas o fato de estar pregado na cruz e a crueldade de sua paixão atormentavam-no totalmente. Assim se levantou, triste e ao mesmo tempo alegre, alternando em si mesmo os sentimentos de alegria e de dor. Tentava descobrir o significado da visão e seu espírito estava muito ansioso para compreender o seu sentido. Sua inteligência ainda não tinha chegado a nenhuma clareza, mas seu coração estava inteiramente dominado por esta visão, quando, em suas mãos e pés começaram a aparecer, assim como as vira pouco antes no homem crucificado, as marcas de quatro cravos” (1Cel 94).

7. Os Anjos de Deus convidaram a Francisco e convida a cada um de nós ao silêncio, à luminosidade, à alegria, ao fortalecimento, à harmonia, à uma mensagem de paz, enfim, convida-nos ao encontro com Deus. Por serem silenciosos, conseguem colocar-nos em contato com o espaço da tranquilidade às vezes muito ausente em nossas vidas. Eles nos convidam ao encontro com o próprio eu, de modo que Deus possa estabelecer uma comunicação conosco. Fiquemos atentos, pois os Anjos de Deus estão sempre apontando o caminho que devemos percorrer; ajudando-nos a ter clareza em nossas confusões e confiança em nossos medos, tal como fez com Maria (Lc 1, 26-38) e José (Lc 1, 5-23). Fiquemos atentos e vigilantes, pois como na vida de São Francisco de Assis, muitas vezes, nos pequenos acontecimentos de nosso dia-a-dia, um anjo de Deus fala conosco; aparece-nos em sonho; defende-nos nos perigos; tudo isso para nos alegrar ou nos consolar e, até mesmo, mostrar que devemos alterar o caminho que estamos prosseguindo.